02 fevereiro 2009

Ver, sentir, confiar


(sugestão da Carolina)

Se escrevesse num diário os sentimentos de cada dia, certamente iria visitar muitas vezes as páginas mais coloridas. Temos a necessidade de regressar aos tempos em que um dia ouvimos claramente o nosso nome e encontrámos a nossa casa perfeita, arrumada, na paisagem que criámos. Porém, à medida que passa o tempo, vamos escrevendo páginas com canetas gastas e as cores vão perdendo força, sem percebermos porquê.

A Vida faz-nos crescer, somos cada vez mais completos e mais complexos; e o que um dia seria óbvio acontecer, hoje é uma miragem, ou uma saudade. Temos nas mãos uma possibilidade de escrever cada dia a nossa história. Mas o que já existiu, não serve para escrever o que hoje sou e me acontece. Simplesmente vamos virando páginas... sucessivamente.

Acredito que aquilo que uma vez foi dado e conquistado não se perde nunca. É esta a nossa marca de eternidade, o poder criar a partir da matéria que são os nossos dias, mesmo que seja terra seca e vasos quebrados. A força que um dia moveu as minhas mãos não deixa de as fazer mover agora. O que tem de ser construído é mais exigente, mas confio que o resultado será uma obra mais perfeita do que posso imaginar.


PS: A questão da ausência de Deus, tenho-o sentido muito pessoalmente, aparece nas alturas em que as coisas se complicam. E quando mais precisaria de Deus, mais encontrei um silêncio incapaz de responder às minhas perguntas. Mas fui-me dando conta de que fui eu que mudei e deixei de estar atento à minha profundidade, sem a fazer crescer comigo. Entretanto a vida muda, mas as raízes permanecem pequenas e com pouca força para me agarrar quando há vento forte. Regressar à profundidade ajudou-me a descobrir respostas que nunca tinha pensado. E percebi que Deus falava, mas de um modo que eu já não conseguia ouvir. Falava-me daquilo que me assustava e preocupava, precisamente aquilo que evitava pensar. E Ele foi paciente comigo e eu fui paciente comigo. Amei o hoje. E as raízes cresceram...

9 comentários:

aileda disse...

Citação:
"Acredito que aquilo que uma vez foi dado e conquistado não se perde nunca..."

Pergunto: _Porque sinto (muitas vezes) que não é bem assim...???

Adoro a vida!!! Acho-a Bela, mas... (TUDO me corre menos bem)

tchi disse...

Persistir na descoberta do caminho da vida. O interior a agigantar-se e Deus cada vez mais perto de ti.

Obrigada por mais esta partilha.

Beijinhos.

susana disse...

sabes.. eu acredito sinceramente que a divindade está dentro de nós, está-nos na matéria de que somos feitos... por isso cada vez que duvidamos de Deus, duvidamos de nós. Cada vez que achamos que Deus não nos ouve, recusamo-nos a ouvir a nós mesmos. Cada vez que acreditamos que ele não nos ama, não nos sabemos amar a nós. Eu não o materializo e aprendo a não julgá-lo porque só assim posso esperar não ser julgada a cada passo que dou. O conceito de divindade cresce connosco, ganha forma à medida das nossas experiência com o mundo e com Nós mesmos. Por isso... regressemos como bem dizes à profundidade: à profundidade de Deuz, como quem diz, à profundidade de nós mesmos.
Um abraço para ti
su

carolbardi@hotmail.com disse...

Obrigada por teres sempre as palavras certas. Obrigada por essa amizade simples, mas que cresce entre um post e outro, com a graça de Deus. Obrigada mesmo. E no meio de tudo isso, sei que os momentos de desolação, cansaço e silencio, são aqueles que mais ajudam a crescer e a fortalecer a fé que nunca se entrega. Sei e sinto a mão de Jesus a puxar por mim, mesmo quando não quero ir.. Continuo a aprender como acreditar e viver com coerencia naquilo que acredito. Obrigada por contribuir para a luz nos momentos de escuridão. Um beijinho grande, com amizade e gratidão. :)

António Valério,sj disse...

Olá, e obrigado a todos pelos comentários, é mesmo ter os vossos feedbacks e saber de que forma aquilo que escrevo ajuda =) Fico muito feliz por ti, Carolina :)


Ailedazav, põe uma questão muito séria, também me pergunto se a visão optimista que dou da vida não será ingénua... vou escrever agora sobre isso...


Susana, continuo a admirar a tua forma de escrever e pensar. E concordo muito com o que dizes, também não concebo um modo de pensar Deus fora da minha realidade, da minha história, dos meus sentimentos e do meu corpo. E somos feitos de eternidade, sabemos como temos em nós energias de criatividade e amor que superam os nossos limites de forma surpreendente.

Se eu percebo que a divindade está em mim, não deixo também de acreditar que a divindade terá de existir fora de mim, eterna... Não é só por ser cristão e jesuíta que o digo, seria recitar uma lição de cor sem saber o que estou a dizer; mas pelo facto de acreditar em Deus fora de mim acho que é o único motivo suficiente para entregar a vida, a inteligência, a afectividade a Ele e aos outros. Mas explico-me, sem entrar em questões de religião ou catequese, o que mais me interessa é a Vida.

Fui descobrindo que, na minha vida, o facto de amar e ser amado foi o que mais me construiu como pessoa. Se o amor e as relações são as coisas mais importantes na vida - e estou convencido que o é, senão haveria pessoas que seriam plenas na maior solidão - confio que esta capacidade de amar não pode ficar limitada a mim. Sei melhor que ninguém como sou limitado a amar... O amor tem de ser uma potência tão extraordinária e completa, que não pode ficar reduzido a gestos voluntarísticos e boas inspirações. Tem de ser ele próprio uma pessoa que sempre ama, sempre perdoa, sempre acompanha, sempre compreende... sempre. Que me dê esta mesma energia, quer quando a perca, quer quando a possa dar. Deus é uma presença enorme, mas que é capaz de me dizer a mim, na minha situação concreta, o que Ele é, e o que eu sou.

Demasiado vago talvez... é difícil escrever estas coisas, seriam horas de conversa =) beijinhos

susana disse...

simplesmente adorei. E sim falaste da questão do exterior que só agora me dei conta de como falo de nós e de como passa a ideia de que é algo interno... mas o que quero dizer é mais no que isso.. é um Nós alargado entendes? Seja à natureza por exemplo.

"O amor tem de ser uma potência tão extraordinária e completa, que não pode ficar reduzido a gestos voluntarísticos e boas inspirações. Tem de ser ele próprio uma pessoa que sempre ama, sempre perdoa, sempre acompanha, sempre compreende... sempre"... ou seja, o amor tem que ser incondicional não é?
Eu acredito no amor incondicional com tanta força! Espero um dia atingir esse estado iluminado.
Um abraço para ti
su

An@ disse...

"E percebi que Deus falava, mas de um modo que eu já não conseguia ouvir. Falava-me daquilo que me assustava e preocupava, precisamente aquilo que evitava pensar."

é aí que as coisas complicam: queremos estar de sorriso aberto e procurar o caminho com mais luz, quando ainda não conseguimos saber o que nos deixa às escuras... :$

*beijo grande, Tó

António Valério,sj disse...

Olá Su! Sim, eu tb acredito no amor incondicional com todas as forças, acredito que não há outro modo de ser completo, ao ser amado assim e ter a capacidade de o fazer da mesma maneira. Porém, este amor incondicional, é Deus, que está em mim e em todas as coisas, mas que também existe por si mesmo. No fundo, estamos os dois de acordo, mas temos diversas perspectivas.É bom sermos diferentes! =) Obrigado por vires ca!

E que bom ver-te por cá, ana! De facto, saber o que nos deixa às escuras é um exercício difícil, mas a verdade não quer que dizer que seja sempre uma coisa óbvia... devemos descobrir também onde nos podemos estar a enganar. Beijinhos*

Carl@ Mesquita disse...

Valério!! Não chega dar-te os Parabéns pelo bom e teu trabalho. Não chega agradecer os gestos ou palavras que ofereces e transmites.
A perserverança, a grandeza da obra que moves e constróis, levas a cada um de nós uma força e um sentido de Felicidade.
Obrigada Amigo;)

 

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