21 maio 2009

Tristeza


Não consigo ficar indiferente à notícia que hoje foi divulgada dos abusos sexuais feitos em várias instituições católicas da Irlanda, entre os anos 30 e 90. Em Março, o Arcebispo de Dublin já tinha alertado para o choque que este relatório iria causar e que, mesmo assim, eram situações que tinham que ser trazidas à luz.


Sinto uma profunda tristeza pela dimensão destes abusos, e creio que nem vale a pena argumentar factos que possam tirar algum peso ao que aconteceu, como o facto de ser uma parte relativamente pequena comparada com o número de crianças e jovens que receberam uma educação boa e humana por parte destas instituições, ou que não eram apenas os religiosos que o faziam, ou que nesses anos alguns tipos de castigos físicos eram considerados normais. São duas mil crianças, mas bastaria uma...


Choca-me o silêncio que se faz quando acontecem estas situações, choca-me ainda mais o facto de alguém que entrega a Vida a Deus e ao serviço dos mais pobres possa fazer algo assim. Revolta-me que estas coisas aconteçam, custa-me aceitar que a Igreja em que vivo e dou a vida tenha também este lado. Não me sinto no direito de julgar ninguém, eu próprio tenho as minhas fragilidades e rezo todos os dias, pedindo para ser melhor, mas o facto de serem tantos revela algo que não está bem.


Nem creio que seja só um problema que os padres não conseguem viver a castidade. Estes casos apontam para uma situação de falta de identidade e integralidade muito mais profundas. É um deixar cair a própria humanidade no mais fundo, perder referências básicas, estar completamente desorientado.


Tenho reflectido muito que tudo isto são sintomas de uma falta de identificação do clero com o seu estatuto e a sua missão. Nos anos a que se referem estes abusos, e hoje ainda mais, o contexto requer que um padre tenha uma consciência muito mais iluminada daquilo que quer e do que Deus lhe pede, que a vocação nasça de uma alegria enorme e a toda a prova, que Deus seja verdadeiramente tudo, unicamente tudo, porque hoje é muito fácil ter tudo...


O que fazer? Rezar por quem sofreu assim, por quem fez isto, mas sobretudo conseguir ser cada dia melhor cristão e melhor jesuíta. Podem ter a certeza, isto acordou-me para a responsabilidade que tenho de ser mais santo, e mais eu próprio... magoamos muito o mundo com a nossa falta de verdade.



4 comentários:

Anónimo disse...

Que triste é sem duvida viver sem verdade...fingir e parecer mais do que ser.
Hoje ao ler-te senti um aperto bem fundo, força e obrigada por esta partilha verdadeira.
A dor de quem sofreu não vai ser apagada, mas Deus confortará aqueles que sofreram e sofrem em seu Nome.

I.O.

Anónimo disse...

É uma dor quase insuportável: Itália, Irlanda, EUA, Austrália... como é que lugares criados para proteger os desprotegidos, dar guarida a quem não tem tecto podem encerrar estas atrocidades?

Foram sentimentos à deriva, mal nutridos e mal amadurecidos, que produziram este resultado. Temos de controlar a nossa indignação para não reagirmos de forma exagerada. Mas não é fácil. Não é de todo fácil.

Muita oração, só mesmo Ele nos consegue acalmar nestas alturas. Não deixo de ficar triste por se ter insistido no anonimato dos perpetradores.

Abraço

carolbardi@hotmail.com disse...

Partilho dessa tristeza contigo. Rezo para não perder a esperança diante de factos tão horríveis. Rezo também pelos que sofrem e para que não haja mais atrocidades dessas escondidas... Realmente, o problema é a falta de verdade, de coragem, de equilibrio...

Grande beijo e bom fim de semana. :)

Leonor disse...

É horrivel e tal como tu, nesta situação e em tantas outras por esse mundo fora, choca.me e doi-me muito o silêncio.

Mas depois, lá está, há o outro lado, e ver dentro Igreja pessoas como tu ... obrigado.
Hoje e se calhar mais vezes, vou rezar por ti.

Boa semana.

 

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