22 fevereiro 2010

Celibato


Sugestão de Aprendiz

Depois de algum tempo, e com muitos temas atrasados, retomo as sugestões! Na altura em que surgiu este tema, recordo-me que era a propósito de um acontecimento muito falado nas comunicação social, em que um jovem sacerdote resolveu deixar o seu sacerdócio por se ter apaixonado. É inquestionável que o tema do celibato provoca muitas reacções, quer da parte de crentes, quer de não crentes.

O celibato é entendido pela Igreja como um sinal de consagração. Uma pessoa decide livremente entregar a sua vida a Deus e ao serviço dos outros, renunciando, não à sexualidade, mas sim ao seu exercício. Um consagrado não é um extraterrestre, é um homem ou uma mulher que vive a sua sexualidade e é chamado, como todos, a vivê-la de forma integrada e aberta à relação com os outros. Não se consegue viver sem afectos, nem a ninguém é pedido isso.

Uma coisa que creio que nunca fica clara é que se fala muitas vezes do celibato como uma imposição. O celibato é um convite a um determinado estilo de vida. Quem escolhe ser padre, ou religioso, sabe que o celibato faz parte da sua escolha e, na sua liberdade, opta por isso. Mesmo consciente da própria fragilidade e da possibilidade que não se possa alguma vez ser coerente com esse compromisso, a pessoa que escolhe ser célibe fá-lo com esse desejo. Uma pessoa que claramente vê que a sua realização pessoal e a sua missão não passa pelo celibato, não escolhe este tipo de vida. Do mesmo modo, a quem casa, não se lhe é imposta a fidelidade, mas é o ponto de partida básico da sua opção. Quem casa ou quem namora, quer verdadeiramente ser fiel, como base de uma relação autêntica e verdadeira. O que quero dizer com isto, é que o celibato nasce de uma opção livre e consciente das suas consequências, incluindo uma certa solidão. Tal como no casamento, se casa livremente e querendo ser fiel, consciente das suas consequências, de alimentar constantemente a relação, mesmo no meio das dificuldades, rotinas e cansaços.

Não quero estar a julgar o comportamento deste sacerdote, que só conheço a história por fora, ou de muitos religiosos que não são coerentes com a própria escolha. Importa é reflectir sobre o porquê de estas coisas acontecerem, se se deve à própria estrutura da pessoa ou falta de maturidade, a uma formação pouco atenta a estes aspectos, ou, a meu ver, a questão principal, o não cuidar o centro da própria vocação, que é a oração. Um padre ou religioso que não reze, não se poderá sentir totalmente apaixonado e centrado, enchendo de afecto de Deus o próprio coração. E sabemos todos como o coração precisa de estar preenchido e, se ficamos divididos nos afectos, acabamos por procurar outras coisas que preencham os nossos espaços vazios. 

Uma outra questão é sobre o porquê de a Igreja católica romana pôr o celibato como fazendo parte do sacerdócio. Esta indicação não é um dogma, nem algo impossível de poder mudar. Sabe-se, que nos primeiros séculos do cristianismo, existiam sacerdotes e bispos casados. Com o passar do tempo, por diversas circunstâncias da época, começou a crescer esta ideia de que o sacerdote devia ser célibe. Não existe uma data concreta em que isto se decidiu, foi um processo longo que a Igreja foi estabelecendo. Teria de escrever muito para explicar todas estas razões e, por isso, aponto-as brevemente e deixo a cada um a curiosidade de poder aprofundar.

Começa a desenvolver-se na mentalidade eclesial a consciência da consagração total a Deus, cuja modelo estaria sobretudo na vida eremítica e monástica, isto é, pessoas que deixavam as cidades para se retirar no deserto e nos campos para se dedicar à oração. Este modelo foi passando, pouco a pouco, também para o clero secular. Uma outra questão começou a ser a preocupação dos bispos nos casos de mau exemplo dos seus padres casados e também, numa altura em que a Igreja tinha poder político sobre diversos territórios, havia o problema da dispersão do património da igreja, por causa dos descendentes dos padres. São estes aspectos, misturados, que pouco a pouco criaram uma mentalidade de que o sacerdote teria de ser célibe e assim se estabeleceu a regra. Porque a Igreja não existe fora da história e experimenta, como todas as instituições humanas, a necessidade de se adaptar aos tempos e configurar o modo como se apresenta, mantendo o que lhe é essencial. 

O celibato, para além do aspecto central da consagração a Deus, tem, na Igreja, um carácter jurídico, isto é, o celibato faz parte do sacerdócio. Mas apenas na Igreja católica de direito romano. Na Igreja católica de direito oriental, em união com o Papa, os padres diocesanos podem escolher casar ou não. Os Bispos, porém, terão de ser célibes. Para poder aprofundar esta questão da igreja católica de rito bizantino (oriental), aconselho a leitura de um texto publicado há tempos, por um companheiro jesuíta, no essejota.net. Por outro lado, os religiosos vivem sempre o celibato, porque professam os votos religiosos de pobreza, castidade e obediência. Os padres diocesanos prometem viver a castidade, mas não tem o mesmo valor jurídico de um voto. Contudo, o essencial da castidade é vivido seja por padres diocesanos, seja pelos religiosos.

Uma última coisa, sobre a possibilidade de que os padres - diocesanos - possam vir a casar. Poderá ser, mas ainda é necessário um tempo de amadurecimento da questão e sobretudo ver se a mentalidade eclesial vai nesse sentido. Uma coisa que é óbvia na mentalidade ocidental, pode não o ser numa outra cultura. Uma lei da Igreja terá de ter em conta a diversidade das culturas onde está inserida, e uma mudança do género teria de vir acompanhada de uma aceitação pacífica e desejada por todos. Se, neste momento, o celibato dos padres fosse abolido, seria aplaudida por muitos, mas também não aceite por muitos. A meu ver, não seria uma questão pacífica na igreja universal, e é necessário que uma mudança sirva para congregar a todos numa única direcção e não para dividir e criar roturas. Mas certamente é uma questão que importa ser repensada e aprofundada.

6 comentários:

Mile Corrêa disse...

Excelente tema, padre!
Muito esclarecedor o seu texto!
Espero que muitos o leiam e quem
sabe compreendam melhor esse
assunto.
Gostei muito.
=]

Lídia disse...

"Celibato" é sempre um tema polémico, é verdade... No entanto, estamos certos de que é uma opção, um estilo de vida. Não é uma imposição de Deus, talvez saja apenas da Igreja, a qual foi aceite! Quantos há que escolhem viver deste modo, sem serem religiosos, padres, consagrados? E preferem dar-se inteiramente a Deus,ou apenas a uma ideologia!
Pronuncio-me simplesmente concordando consigo quando refere que nada é permanente, tudo é mutável, embora as grandes mudanças sugiram também grandes polémicas!!

Tudo de bom.
Beijinhos
Lídia

António Valério,sj disse...

Obrigado pelo comentários e fico contente que tenha esclarecido algumas coisas.
Lídia, é verdade que muitas pessoas escolhem o celibato como modo de vida, mesmo não sendo consagrados, o que não quer dizer que quem é consagrado não tenha a mesma liberdade, apenas passa a fazer parte de uma estrutura. Como disse, a Igreja faz parte da história e o que agora existe é fruto de um processo e de escolhas que em determinada altura se achou serem as melhores. E nunca se sabe como será no futuro, mas acredito que na altura certa se tomarão as decisões que farão um maior bem à Igreja. beijinhos!

Fá disse...

Todos somos sexuados e ainda bem. Significa que não conseguimos ser inteiros sozinhos. E se isto é verdade, celibatários e não celibatários diferenciar-se-ão apenas pela forma como organizaram a sua vida e estabeleceram as suas prioridades. Importa sobretudo falar da FIDELIDADE: a Deus, às pessoas, aos valores, aos ideais, à vida! E aí estamos em pé de igualdade. Todos diferentes, todos iguais:)

Um abraço amigo

Anónimo disse...

Crescer é isto mesmo! Obrigado pela ajuda

Anónimo disse...

A Igreja devia dar liberdade para os Padres escolher. Não é opção ser Sacerdote e ter de aceitar o celibato. Isso não é liberdade real, é uma condição. A todos falta-nos liberdade na Igreja.

Mário

 

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