Sugestão de Aprendiz
Depois de algum tempo, e com muitos temas atrasados, retomo as sugestões! Na altura em que surgiu este tema, recordo-me que era a propósito de um acontecimento muito falado nas comunicação social, em que um jovem sacerdote resolveu deixar o seu sacerdócio por se ter apaixonado. É inquestionável que o tema do celibato provoca muitas reacções, quer da parte de crentes, quer de não crentes.
O celibato é entendido pela Igreja como um sinal de consagração. Uma pessoa decide livremente entregar a sua vida a Deus e ao serviço dos outros, renunciando, não à sexualidade, mas sim ao seu exercício. Um consagrado não é um extraterrestre, é um homem ou uma mulher que vive a sua sexualidade e é chamado, como todos, a vivê-la de forma integrada e aberta à relação com os outros. Não se consegue viver sem afectos, nem a ninguém é pedido isso.
Uma coisa que creio que nunca fica clara é que se fala muitas vezes do celibato como uma imposição. O celibato é um convite a um determinado estilo de vida. Quem escolhe ser padre, ou religioso, sabe que o celibato faz parte da sua escolha e, na sua liberdade, opta por isso. Mesmo consciente da própria fragilidade e da possibilidade que não se possa alguma vez ser coerente com esse compromisso, a pessoa que escolhe ser célibe fá-lo com esse desejo. Uma pessoa que claramente vê que a sua realização pessoal e a sua missão não passa pelo celibato, não escolhe este tipo de vida. Do mesmo modo, a quem casa, não se lhe é imposta a fidelidade, mas é o ponto de partida básico da sua opção. Quem casa ou quem namora, quer verdadeiramente ser fiel, como base de uma relação autêntica e verdadeira. O que quero dizer com isto, é que o celibato nasce de uma opção livre e consciente das suas consequências, incluindo uma certa solidão. Tal como no casamento, se casa livremente e querendo ser fiel, consciente das suas consequências, de alimentar constantemente a relação, mesmo no meio das dificuldades, rotinas e cansaços.
Não quero estar a julgar o comportamento deste sacerdote, que só conheço a história por fora, ou de muitos religiosos que não são coerentes com a própria escolha. Importa é reflectir sobre o porquê de estas coisas acontecerem, se se deve à própria estrutura da pessoa ou falta de maturidade, a uma formação pouco atenta a estes aspectos, ou, a meu ver, a questão principal, o não cuidar o centro da própria vocação, que é a oração. Um padre ou religioso que não reze, não se poderá sentir totalmente apaixonado e centrado, enchendo de afecto de Deus o próprio coração. E sabemos todos como o coração precisa de estar preenchido e, se ficamos divididos nos afectos, acabamos por procurar outras coisas que preencham os nossos espaços vazios.
Uma outra questão é sobre o porquê de a Igreja católica romana pôr o celibato como fazendo parte do sacerdócio. Esta indicação não é um dogma, nem algo impossível de poder mudar. Sabe-se, que nos primeiros séculos do cristianismo, existiam sacerdotes e bispos casados. Com o passar do tempo, por diversas circunstâncias da época, começou a crescer esta ideia de que o sacerdote devia ser célibe. Não existe uma data concreta em que isto se decidiu, foi um processo longo que a Igreja foi estabelecendo. Teria de escrever muito para explicar todas estas razões e, por isso, aponto-as brevemente e deixo a cada um a curiosidade de poder aprofundar.
Começa a desenvolver-se na mentalidade eclesial a consciência da consagração total a Deus, cuja modelo estaria sobretudo na vida eremítica e monástica, isto é, pessoas que deixavam as cidades para se retirar no deserto e nos campos para se dedicar à oração. Este modelo foi passando, pouco a pouco, também para o clero secular. Uma outra questão começou a ser a preocupação dos bispos nos casos de mau exemplo dos seus padres casados e também, numa altura em que a Igreja tinha poder político sobre diversos territórios, havia o problema da dispersão do património da igreja, por causa dos descendentes dos padres. São estes aspectos, misturados, que pouco a pouco criaram uma mentalidade de que o sacerdote teria de ser célibe e assim se estabeleceu a regra. Porque a Igreja não existe fora da história e experimenta, como todas as instituições humanas, a necessidade de se adaptar aos tempos e configurar o modo como se apresenta, mantendo o que lhe é essencial.
O celibato, para além do aspecto central da consagração a Deus, tem, na Igreja, um carácter jurídico, isto é, o celibato faz parte do sacerdócio. Mas apenas na Igreja católica de direito romano. Na Igreja católica de direito oriental, em união com o Papa, os padres diocesanos podem escolher casar ou não. Os Bispos, porém, terão de ser célibes. Para poder aprofundar esta questão da igreja católica de rito bizantino (oriental), aconselho a leitura de um texto publicado há tempos, por um companheiro jesuíta, no
essejota.net. Por outro lado, os religiosos vivem sempre o celibato, porque professam os votos religiosos de pobreza, castidade e obediência. Os padres diocesanos prometem viver a castidade, mas não tem o mesmo valor jurídico de um voto. Contudo, o essencial da castidade é vivido seja por padres diocesanos, seja pelos religiosos.
Uma última coisa, sobre a possibilidade de que os padres - diocesanos - possam vir a casar. Poderá ser, mas ainda é necessário um tempo de amadurecimento da questão e sobretudo ver se a mentalidade eclesial vai nesse sentido. Uma coisa que é óbvia na mentalidade ocidental, pode não o ser numa outra cultura. Uma lei da Igreja terá de ter em conta a diversidade das culturas onde está inserida, e uma mudança do género teria de vir acompanhada de uma aceitação pacífica e desejada por todos. Se, neste momento, o celibato dos padres fosse abolido, seria aplaudida por muitos, mas também não aceite por muitos. A meu ver, não seria uma questão pacífica na igreja universal, e é necessário que uma mudança sirva para congregar a todos numa única direcção e não para dividir e criar roturas. Mas certamente é uma questão que importa ser repensada e aprofundada.